Thursday, November 24, 2011

The Piano - Amazing Short - Animation by Aidan Gibbons, Music by Yann Ti...

Hoje faço um pacto com esta musica...fará parte de mim, tal como eu farei parte dela.






Hoje quero sossego e exílio.

Não quero palavras, quero solidão.

Solidão de todos,

solidão de mim.

Wednesday, November 23, 2011


De um momento para o outro a nossa vida fica virada de pernas para o ar. Num momento temos tudo sem nos apercebermos, no segundo seguinte sentimos a carne a desprender-se dos ossos.

A dor é tão insuportável que sentimos a pele a queimar, os ossos a serem esmagados, cada membro do nosso corpo a ser arrancado devagarinho, propositadamente para causar dor. Ao contrário do que sempre pensei, esta dor não me fez sentir viva, mas sim morta por dentro.

É incrível como coisas que nos foram completamente indiferentes na maior parte da nossa vida passam, de um instante para o outro, a ser inesquecíveis...pelas razoes erradas. O dia 24 de Novembro será, para o resto da minha vida, um dia de morte. O dia em que perdi .. o dia em que me apercebi que estava a dar atenção às coisas erradas...que corria para os sítios errados, que não dava atenção suficiente às pessoas certas.

Neste dia, metade do meu mundo ruiu. E eu, estava a dormir. Não me despedi e sei que chamaram por mim. Estava a dormir porque estava cansada, estava cansada porque trabalhei mais horas..

Escolhas. Fazemos das nossas escolhas, a nossa vida. Quase sempre, escolhemos erradamente..

E, por vezes, as nossas escolhas são irreversíveis e o que perdemos, é irrecuperável.

Em dois meses, perdi duas das três pessoas mais importantes da minha vida.

São irrecuperáveis. Insubstituíveis. E a palavra NUNCA começa a fazer sentido.

A palavra ADEUS passa a fazer parte da nossa vida,verdadeiramente.

Tive esta pessoa em todos os momentos da minha vida.

Já não a tenho mais.

E faz-me tanta, tanta falta.

De um segundo para o outro, passei a odiar este dia.






16H15

24 novembro 2010

e a minha avó O deixou de respirar.




- nao saberei nunca dizer adeus.-








Tuesday, November 15, 2011

Não saberei nunca
dizer adeus

Afinal,
só os mortos sabem morrer

Resta ainda tudo,
só nós não podemos ser

Talvez o amor,
neste tempo,
seja ainda cedo

Não é este sossego
que eu queria,
este exílio de tudo,
esta solidão de todos

Agora
não resta de mim
o que seja meu
e quando tento

o magro invento de um sonho
todo o inferno me vem à boca

Nenhuma palavra
alcança o mundo, eu sei
Ainda assim,

escrevo.

Mia Couto

Monday, November 7, 2011

Linda Martini - Amor Combate

amar é sabotar,

não só os outros, mas a nós próprios.

auto-danificar a alma, auto-mutilar o espírito.

amamos porque sabemos ser finito.

não ousariamos amar se soubéssemos que iria durar para sempre.

somos precários,

não sabemos andar em frente, sem olhar para trás.

somos finitos.

não conseguimos viver sem ter limites ou paredes a enclausurar.

somos uns tristes,

só lutamos quando sabemos que podemos perder,

damos valor sempre às coisas erradas.


Pensamos que há sempre tempo. Errado.
Não o controlamos, ele é que nos controla.


o único amor em que acreditei já o perdi

e aquilo que guardei para dizer no fim,

já não tenho a quem dizer.

nem sempre ganha a melhor parte.

Aprendi.







Monday, October 10, 2011

Sou a mão que semeia a flor e, tantas vezes, o pé que a pisa.

Wednesday, August 24, 2011




"A morte nada é.


Eu apenas estou do outro lado

Eu sou eu, tu és tu.

Aquilo que éramos um para o outro

Continuamos a ser.

Chama-me como sempre me chamaste.

Fala-me como sempre me falaste.

Não mudes o tom da tua voz,

Nem faças um ar solene ou triste.

Continua a rir daquilo que juntos nos fazia rir.

Brinca, sorri, pensa em mim,

Reza por mim.

Que o meu nome seja pronunciado em casa

Como sempre foi;

Sem qualquer ênfase,

Sem qualquer sombra.

A vida significa o que sempre significou.

Ela é aquilo que sempre foi.

O ‘fio’ não foi cortado.

Porque é que eu, estando longe do teu olhar,

Estaria longe do teu pensamento?

Espero-te, não estou muito longe,

Somente do outro lado do caminho.

Como vês, tudo está bem."

Tuesday, July 19, 2011

o homem biológico reage, defende-se, transfigura-se.

o homem social contemporiza, ataca, envenena.

Entre os dois, estamos muitos.

Monday, July 4, 2011

Tenho projectos e perspectivas de ser pequena, pois não ha imensidão no mundo suficiente que me preencha.
Animo-me porque não tenho escolha. Porque a verdade é que por muito que se corra, acabamos sempre todos por chegar ao mesmo lugar. Que me resta senão a lassidão dos dias, a passividade dos que me rodeiam, o bater nunca finito de um relógio que não se vê. E, na hora nunca marcada, nunca esperada, nem nunca anunciada, digo adeus e viro as costas ao sol. E permanecerei obstinadamente, a avançar em frente, pioneira das minhas ideias. Fiz coisas erradas pelas razoes certas. Orgulho-me do meu desassossego, mesmo que por vezes se torne difícil conviver com ele.

Sunday, July 3, 2011

"Sonhar, porque se desistimos disso apaga-se a última claridade e nada mais valerá a pena. Escapar, na liberdade do pensamento, desse espírito de manada que trabalha obstinadamente para nos enquadrar, seja lá no que for.
E que o mínimo que a gente faça seja, a cada momento, o melhor que afinal se conseguiu fazer."

Wednesday, May 18, 2011



"Este foi o nosso último abraço. E quando,
daqui a nada, deixares o chão desta casa
encostarei amorosamente os lábios ao teu copo
para sentir o sabor desse beijo que hoje não
daremos. E então, sim, poderei também eu
partir, sabendo que, afinal, o que tive da vida
foi mais, muito mais, do que mereci."

Friday, May 6, 2011





"...sabia que era preciso tempo. Cada perda tem a sua hora de acabar, cada morto o seu prazo de partir. Até ao último suspiro a vida é um processo."



" E a dor faz parte."

Monday, April 18, 2011

"Os fracos vingam-se, os fortes protegem-se."

Friday, April 15, 2011


"Não é no espaço que de devo procurar a minha dignidade, mas na direcção do meu pensamento. Não terei mais de possuir mundos. No espaço, o universo cerca-me e engole-me como um átomo: com o pensamento compreendo o mundo."

Sunday, April 10, 2011

...Hoje senti saudades de ti...

...Sinto, todos os dias.

Feliz Aniversário.

Wednesday, March 16, 2011



Palavras são utopias....

...há feridas que nos queimam para sempre.

Thursday, March 10, 2011

Respiro, todos os dias, com uma saudade atordoante de me não pertencer.

Sobra-me o calor de um abraço que não terei mais e o conforto dos olhos cinzentos que já não me olham.

Jamais terei medo de viver. Jamais viverei com tanto amor.

Saturday, February 26, 2011


"Aqui nesta praia onde
Não há nenhum vestígio de impureza,
Aqui onde há somente
Ondas tombando ininterruptamente,
Puro espaço e lúcida unidade,
Aqui o tempo apaixonadamente
Encontra a própria liberdade."

Sunday, February 20, 2011

"A ferida dói como dói
E não em função da causa que a produziu."



"Viva a Hipocrisia!
Que nos coloca rótulos
E facilita o trabalho
De quem vem nos comprar."

Monday, February 14, 2011

‎"Passamos pelas coisas sem as ver,
gastos, como animais envelhecidos:
se alguém chama por nós não respondemos,
se alguém nos pede amor não estremecemos,
como frutos de sombra sem sabor,
vamos caindo ao chão, apodrecidos."

La Valse d'Amelie

Friday, February 11, 2011

No Teu Poema - Simone de Oliveira



No teu poema
existe um verso em branco e sem medida,
um corpo que respira, um céu aberto,
janela debruçada para a vida.
No teu poema existe a dor calada lá no fundo,
o passo da coragem em casa escura
e, aberta, uma varanda para o mundo.
Existe a noite,
o riso e a voz refeita à luz do dia,
a festa da Senhora da Agonia
e o cansaço
do corpo que adormece em cama fria.
Existe um rio,
a sina de quem nasce fraco ou forte,
o risco, a raiva e a luta de quem cai
ou que resiste,
que vence ou adormece antes da morte.
No teu poema
existe o grito e o eco da metralha,
a dor que sei de cor mas não recito
e os sonhos inquietos de quem falha.
No teu poema
existe um cantochão alentejano,
a rua e o pregão de uma varina
e um barco assoprado a todo o pano.
Existe um rio
a sina de quem nasce fraco ou forte,
o risco, a raiva e a luta de quem cai
ou que resiste,
que vence ou adormece antes da morte.
No teu poema
existe a esperança acesa atrás do muro,
existe tudo o mais que ainda escapa
e um verso em branco à espera de futuro.

Saturday, February 5, 2011

Friday, January 28, 2011

Álvaro de Campos - Tabacaria



TABACARIA

"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar?
Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.
(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.
(Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)
Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente
Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.
Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.
Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu."


Álvaro de Campos, 15-1-1928

DEAD COMBO "Putos A Roubar Maçãs"




"(...) Ao longo da muralha que habitamos, há palavras de vida, há palavras de morte,há palavras imensas, que esperam por nós e outras, frágeis, que deixaram de esperar (...)."

CARTA PARA JOSEFA, MINHA AVÓ

"Tens noventa anos.És velha, dolorida.Dizes-me que foste a mais bela rapariga
do teu tempo - e eu acredito. Não sabes ler.Tens as mãos grossas e
deformadas, os pés encortiçados. Carregaste à cabeça toneladas de restolho e
lenha, albufeiras de água.Viste nascer o Sol todos os dias.De todo o pão que
amassaste se faria um banquete universal!Criaste pessoas e gado, meteste os
bácoros na tua própria cama quando o frio ameaçava gelá-los.Contaste-me
histórias de aparições e lobisomens, velhas questões de família, um crime de
morte.Trave da tua casa, lume da tua lareira sete vezes engravidaste, sete
vezes deste à luz.
Não sabes nada do Mundo. Não entendes de política, nem de economia, nem de
literatura, nem de filosofia, nem de religião.Herdaste umas centenas de
palavras práticas, um vocabulário elementar.Com isto viveste e vais
vivendo.És sensível às catástrofes e também aos casos da rua, aos casamentos
de princesas e ao roubo dos coelhos da vizinha.Tens grandes ódios por
motivos de que já perdeste lembrança, grandes dedicações que assentam em
coisa nenhuma.Vives.Para ti, a palavra Vietnam é apenas um som bárbaro que
não condiz com o teu círculo de légua e meia de raio.Da fome sabes alguma
coisa: já viste uma bandeira negra içada na torre da igreja.(Contaste-me tu,
ou terei sonhado que o contavas?...) Transportas contigo o teu pequeno
casulo de interesses.E, no entanto, tens os olhos claros e és alegre.O teu
riso é como um foguete de cores.Como tu, não vi rir ninguém.
Estou diante de ti e não entendo.Sou da tua carne e do teu sangue, mas não
entendo.Vieste a este Mundo e não curaste de saber o que é o Mundo.Chegas ao
fim da vida, e o Mundo ainda é, para ti, o que era quando nasceste: uma
interrogação, um mistério inacessível, uma coisa que não fazia parte da tua
herança: quinhentas palavras, um quintal, a que em cinco minutos se dá a
volta, uma casa de telha vã e chão de terra batida.Aperto a tua mão calosa,
passo a minha mão pela tua face enrugada e pelos teus cabelos brancos,
partidos pelo peso dos carregos- e continuo a não entender.Foste bela,
dizes, e bem vejo que és inteligente.Porque foi então que te roubaram o
mundo? Quem to roubou? Mas disto entendo eu, e dir-te-ia o como, o porquê e
o quando se soubesses compreender.Já não vale a pena.O mundo continuará sem
ti- e sem mim.Não teremos dito um ao outro o que mais importava.
Não teremos realmente? Eu não te terei dado, porque as minhas palavras não
são as tuas, o mundo que te era devido.Fico com esta culpa de que me não
acusas- e isso ainda é pior.Mas porquê, avó, porque te sentas tu na soleira
da porta, aberta para a noite estrelada e imensa, para o céu de que nada
sabes e por onde nunca viajarás, para o silêncio dos campos e das árvores
assombradas, e dizes com a tranquila serenidade dos teus noventa anos e o
fogo da tua adolescência nunca perdida: "O mundo é tão bonito, e eu tenho
tanta pena de morrer!"
É isto que eu não entendo- mas a culpa não é tua.


José Saramago


Para as minhas eternas luzinhas. Adeus.

Thursday, January 27, 2011

Estacionei no tempo, e o meu corpo tornou-se uma casa sem sonhos.

-Até amanha, se Deus quiser.

-Adeus avó M.


26 Janeiro 2011/ 15h

Monday, January 17, 2011


"Somos tão bons a perder


quando não queremos ganhar."

Sunday, January 16, 2011


Permanecerei, obstinadamente, à espera de quem o mundo me levou..


À conta de não sabermos lidar com o nosso ego, atulhamos a nossa frustraçao de nunca atingir o inimaginavel, com casas, carros, roupas de marca, fios horrosos e caríssimos, berlicoques e bugigangas de ingles ver.

E por isso, passamos todos os dias, numa luta cada vez mais intensa, a encher-nos de coisas sem importancia nenhuma e a afastarmo-nos daquilo que é importante.

O Homem comum sonha o que é sonhável.
Não é das saudades de que tenho medo. Não é a tristeza que receio. Não é aquilo que o mundo diz ou pensa que me afronta. É do vazio. É desta falta de vontade de Ser.

É desta ideia obstinada de não me pertencer.